segunda-feira, 16 de agosto de 2010

A fuga

Era de noite, e estávamos – mamãe, papai e eu – no carro, indo não sei para onde. Como de costume, meu pai se perdeu no caminho e fomos parar em um beco escuro e deserto. Meu pai foi fazer o retorno em um lote vago, quando nós fomos cercados por um bando de homens mal encarados e armados – não vi direito com o quê, mas sabia que não eram armas de fogo. Na mesma situação que a gente estava um outro homem, mais ou menos da idade do meu pai.
Como esse outro homem havia chegado primeiro, os homens mal encarados resolveram acertar logo com ele. Mandaram o homem sair do carro e foram dando safanões nele até ele chegar em um canto do lote, longe do carro. Meu pai também saiu do nosso carro, mas os homens mal encarados o mandaram esperar. Meu pai estava perto da saída, ao lado do carro do homem.
Não sei direito por que, o homem que estava sozinho começou a se agitar e os homens mal encarados também. Começou uma gritaria, um corre-corre e alguns safanões no homem sozinho. Nessa hora, vi meu pai olhar para o carro do homem sozinho. Falei “Mãe, troca de lugar que meu pai vem pra cá”. Mas aí vi que meu pai ia para o outro carro e gritei: “Mãe, dirige este carro! Vai!”
Meu pai correu para o carro do homem sozinho, que estava com as portas abertas e a chave na ignição. Bateu a porta e arrancou com força. Minha mãe venceu o torpor e arrancou nosso carro também com força, quase atropelando um dos homens mal encarados – este usava chapéu e parecia ser o chefe da gangue. Quase fomos pegas na troca de marcha, mas conseguimos fugir. Paramos mais na frente, com os olhos arregalados, a boca seca e o coração querendo sair do peito. Meu pai estava logo à nossa frente, também são e salvo, no carro do outro homem.  
Quando acordei, o vento – que soprou forte a madrugada inteira – assoviava na janela e fazia o telhado da casa velha do vizinho bater fazendo barulho. Outros barulhos – de cidade abandonada – também eram obra desse vento do qual eu não gosto. Fiquei grata por ter sido um sonho ruim, mas o aperto no peito ainda mora aqui temporariamente.

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Tão óbvio

Depois de uma manhã de muita, mas muita briga com a Vivo por causa de uma conta errada, saí para o almoço. No restaurante, sentei em uma mesa ao lado de duas pessoas – homem e mulher – que pareciam ser colegas de trabalho. Ela, muito natural, falando de uma relação recém terminada. Ele, olhando intensamente no fundo dos olhos dela, com a mão quase na mão dela em cima da mesa e participando muito interessadamente na conversa.
Eles falavam muito baixinho, mas consegui ouvir ele perguntando “Mas você acha que terminou mesmo?” com ares desinteressados, mas que escondiam uma grande esperança. Ela, alheia ao que provocava na cabeça dele, falava que ele tinha cílios lindos e declarava que, um dia, ainda faria implante (sim, isso existe). E ele respondia que não sem palavras.
O problema é que ela via nele um amigão. E ele via nela “a nora que mamãe queria”. Vi que ela nunca iria entender daquele jeito. Fiquei aflita. Terminei de comer rápido, peguei meu brigadeiro, levantei da mesa e vim para o trabalho, imaginando que futuro terá essa história.