É claro que, imediatamente após a chegada dos móveis novos, Hamlet – seu cachorro – “estreou” os sofás. Mijou no pé de um e na almofada – sim, ele era de fato uma praga – de outro. Assim que ela descobriu, tirou a almofada, colocou debaixo da torneira, lavou com Ariel líquido, enxaguou bem e colocou ao ar livre para secar. No domingo de manhã, a almofada até tomou um solzinho de leve, já que a chuva havia cessado. Seca, ela recolocou a almofada em seu mais novo reduto, o sofá de três lugares.
Depois de encontrar uma amiga para um lauto café da manhã e tendo descoberto que não precisaria mais hospedar um amigo que chegaria naquele dia, a moça decidiu que o resto do domingo seria passado... no sofá, claro. Colocou a caminha B de Hamlet aos seus pés e ali ele deitou para curtir a domingueira junto com sua diligente dona.
Ela começou a ver um filme no computador e, em um determinado momento, já tendo digerido o café da manhã, saiu para pegar um lanche. Hamlet, que normalmente vai atrás de quem se levanta no matter where a pessoa esteja indo e fazer o quê, nem se preocupou em saber para que ela havia se levantado. A moça foi à cozinha, pegou o pacote de biscoitos e voltou para o sofá. Rápido assim: uns trinta segundos, no máximo. Ao chegar de volta na sala e se deitar, sentiu um molhado em seu joelho. “Filho da p*ta! Mijou aqui de novo”, pensou ela sobre Hamlet, já que ela é uma moça sem meias palavras. Cheirou a mancha e, para sua surpresa, o cheiro que vinha dela era de Ariel líquido. Ou seja, não era xixi, era água.
Estava chovendo, mas a janela estava fechada. Ela, então, ignorando o fato de que acima de sua cabeça havia a laje do terraço de sua própria casa, olhou para cima, para se certificar de que não havia goteiras – neste caso, corredeiras, pois o molhado no sofá era grande demais para uma gota – mas encontrou o teto seco, assim como a cortina. A água havia simplesmente brotado do sofá e isso havia acontecido enquanto ela havia ido à cozinha.
“E daí?” E daí que está criado o mistério. Se não havia sido Hamlet, nem a água que veio da janela e nem um derramamento do teto do apartamento, não havia explicação cabível para aquela água. Para se conformar, a moça elaborou algumas hipóteses, que foram inclusive apoiadas por seu namorado: gremlins; duendes; gnomos; bruxaria; fantasmas que vieram juntamente com os sofás, e esse foi o real motivo pelo qual sua prima se livrou deles. Preferiu parar de pensar no assunto para não conviver com a angústia de ter esse mistério não solucionado em sua vida. E, no caso de a mancha molhada ser mesmo efeito de algo de outro mundo, já se resignou que conviverá bem com a criatura, seja ela qual for. Afinal, ela já convive com Hamlet mesmo...